terça-feira, 30 de abril de 2013

Sônia, Soninha.

Dia desses fiz um "Happy sei lá" com a Sônia, que insiste que eu a chame de Soninha (não gosto apelidos em diminuto, mas vá lá, ela gosta, e não se discute amenidades com uma cria de costela). Foi nosso décimo encontro, medido e milimetrado, tudo de cor por ambas as partes, até as roupas que usamos. E não reparo muito em roupa, apenas na falta, tanto ela menos. Fomos ao Bar do Gaúcho, esquina do prédio que trabalho. Lá é legal, chopp gelado e um bom sanduíche de carne. Lembro quando nos conhecemos, quis lhe apelidar mas sem sucesso. Isso só por Sônia me lembrar uma prostituta da Rua da Areia, que lá pelos finados anos noventa, tive o prazer de conhecer.

Época de vinte e poucos anos, um pouco barbado, um peito, que além dos cabelos, era cheio de vontade de viver. Conversava muito com a Sônia da Areia, ela tinha uma filhota que não lembro o nome, e sempre me falava de sonhos, disso e daquilo. Certa feita, estava eu sentado numa mesa do cabaré que ela fodia com deus e o diabo, e ela aparece meio triste, em seus braços brancos umas manchas de pancada. Não fiz pergunta retórica, apenas lhe paguei umas doses de uísque e ouvi sua lamuria.

Mas a Soninha hoje é diferente, em tudo, não melhor, nem pior. Soninha faz jus ao diminutivo, cara de meninota num corpaço, e o pior que ela sabe disso, e se aproveita (safada santa). Me conta suas peripécias sem medir. Ficaria horas ouvindo a Soninha, e sem tocar num fio de sobrancelha, mas não aguento, ela sempre me chama para tomar um vinho na sua casa, o que aquece minhas orelhas e o resto.

E na sua geladeira morre metade de uma cebola, uma garrafa d'água, umas outras de vinho e um molho do tomate aberto. A gente trepa e vai tomar banho. Deitamos na cama, a janela aberta denuncia a madrugada silenciosa e linda, fumamos um cigarro e ouvimos a noite, mas não de conchinha, nem porra nenhuma, apenas deitados na cama dura, esperando meu pau subir para outra trepada com a Soninha.

Sobreviver, à vida.


Alimente a vida de você, daquilo que te faz sobreviver. Um dia dormindo, uma noite de sexo, uma tarde regada a droga e rock, ou um simples copo de nutella. Nada importa do lado de fora. Faça aquilo que dá na telha, sem prejudicar o outro, e o mais importante, que seja sem vergonha, pra valer, viver e morrer.

Foto: Transitando por aí, em dia de quase noite.

sexta-feira, 26 de abril de 2013

Papo de sola furada



Um sapato furado, para proteger o pé, pedaço de jornal. Resenhas sobre coisas, as vezes é bom papo mais furado que sola, só as vezes, coisa rara mesmo. E vamos pedir a conta, na cama tem coisa melhor para fazer.

Foto: Cinelândia indo dormir.

terça-feira, 23 de abril de 2013

Segredos do mundo


Fui andar por aí como quem não quer nada, mas que tem sede de mundo, de coisas que falam no silêncio dos gestos.

Um homem gordo na fila do caixa de uma farmácia chupava um picolé amarelo, e tentava sacar seu cartão, para pagar uma caixa de fraldas; pedreiros levantavam paredes num prédio de dois andares, parecendo formigas ajuntando retalhos de folhas para o inverno; pessoas na academia malham seus músculos e barrigas inúteis, quando quando servem para algo, é fazer pose para tentar comer alguém, ou serem comidas; duas meninotas passeiam na calçada da praia e riem (será que falavam de algum marmanjo?); um jovem se ajoelha aos pés d'uma garota, e a lhe confessar pecados, cai no precipício do amor, levanta, puxa, abraça, e a beija fogosamente; um homem passa correndo, usa uma camisa de corrida, ele acena para mim, cordial até, respondo e o vejo passar, e ir correndo sei lá para onde; uma velha com artrite caminha lenta olhando para a espuma do mar, acho que ela tenta apagá-las com seu sopro fraco; um outro casal caminha lento pela areia, ambos calçando as sandálias do tédio, que não fazem barulho nas areias da praia; um menino brinca com um cachorro pastor-alemão...

Na minha solidão fito todos, e todos fazem parte de mim, e me dizem um segredo. Vejo que não estou sozinho, mas conheço todos. Tento empurrar as nuvens com um sopro, não consigo, e a lua que nasceu hoje a tarde (e é estranho quando a lua nasce a tarde, ela deveria nascer sempre ao por-do-sol), olho para ela e vou tomar um banho. Mergulho para ver o sol descer indo até o Japão. E tentando não me afogar no mar, apenas me permito sonhar, naquilo que é viver, sofrer e calar.

Foto: Praia do Bessa - João Pessoa/PB. Em dia que é terça-feira.

segunda-feira, 22 de abril de 2013

Me Joguei



E tudo que é subversivo atrai, assim como um céu azul, um mar vazio, e um sol do carai.

Foto: João Pessoa/PB. Indagorinha. Aqui na frente, perto do mar.

sexta-feira, 19 de abril de 2013

Eduarda



Conheci Eduarda quando ia ao trabalho, no ônibus. Foi há uns meses passados, sei lá quantos, sempre me perco no tempo. Entrei meio afobado, mas lá alguns lugares vazios, e o assento ao lado dela me chamava. Cruzei a roleta em disparada. Me acomodo e invade meus pulmões um doce cheiro do seu shampoo, pouco depois, de sabonete. Ela tinha feito nos cabelos um par de tranças loiras e lindas; usava uma vestido laranja claro, que não cobria os joelhos, deixando suas lindas pernas meio de fora, entregando o ouro dos pelinhos loiros; sandália rasteira, dessas de feira; e o sutiã? deixou em casa.
Abro minha mochila e saco três folhas que carregavam umas linhas escritas pelo velho safado. Ela, que já me olhava meio de lado, minutos depois puxa...

- Desculpa te atrapalhar, mas como você consegue ler dentro dessa merda de ônibus? Quem ouve música, até entendo, mas  ler? Deve ser meio foda.
- Nem tanto, foda é sempre algo bom, e eu consigo ler até no meio de um show, imagina aqui, é paraíso.
- Sorte sua. Só consigo ler naqueles silêncios absolutos, que a gente ouve até o barulho d'uma agulha cair no chão.
- Que merda, ler pra você é madrugar, mas é a melhor hora para se viver.
- Pois é, por aí...
(...)
Mais umas outras poucas frases, números de celular trocados e tchau.

Alguns dias pós primeiro encontro, nos reencontramos no mesmo ônibus, mesmo horário, mesmo quase tudo. Ela sem tranças, mas de cabelos presos, vestia uma calça jeans desbotada, camisa hering azul e calçava algo que eu diria ser um tênis. E os cheiros, os mesmos, shampoo e sabonete. Abriu um sorriso lindo, e carregando sua inseparável bolsa de pano, onde vai sempre: celular, identidade, cartão do banco e uns trocados, me recebe ao seu lado, abriu espaço para mim. Nesse dia conversamos mais que o normal, ela meio tagarela, dizia coisas do trabalho (a labuta é num escritório de engravatadinhos advogadinhos, bobos), e por aí foi.
Eduarda é engraçada e calada, não faz questão de muita coisa, quase nada. Na geladeira meia cebola e umas garrafas de cerveja. E quando aporto por lá, sempre pela manhã, uma trepada e cuscuz com ovos, que eu faço e ela adora. Mas não gosta de retratos e de falar muito.
E assim vamos sobrevivendo, entre trepadas coloridas, sorrisos sinceros e as vezes um não querer entendido. Vez por outra pegamos o mesmo ônibus, vez por outra nos escondemos numa cama, e olhamos mudos a banda passar, mas sem cantar coisas de amor, pois isso é uma merda.

domingo, 7 de abril de 2013

Meus vinis e meus livros



Hoje lembrei do meu amigo, Robson, que assim como eu, ele gosta de comprar vinil e livro em sebos. Certa feita estava na casa dele, um belo sábado em que ouvíamos rock progressivo (o estilo preferido por ele), lá vou eu buscar mais um vinil pra ouvirmos. Na casa tem um quarto que é meio escritório, cheio de livros e discos por tudo que é lado, pego um disco e vejo alguns livros com cara de desgasto, volto à sala e indago sobre os livros que vi. Ele me diz que só compra livro em sebo, etc e tal, e vai me contando de uma prima dele. Ela meio cismada com as coisas do além, sempre dizia algo do tipo: não sei como você consegue ter isso aqui na sua casa, esses livros são de outra pessoa, sabe-se lá por onde andaram, eles podem carregar energias negativas. Na feita, comentei do Ari, outro amigo meu, também comprador de vinil. O Ari tem uma coisa que é meio cacoete loucura, ele compra os discos, e antes dos discos entrarem na sua casa, ele limpa tudo, lava e benze.
Há um barato na compra de coisas usadas, e não me pesa o fato da prima do Robson achar que carregam "coisas ruins", pois carregam coisas, interessantes. Tenho discos com dedicatórias, declarações de amor, juras e mais juras. Os livros não tenho, pois livro só leio uma vez e despacho (troco por outros).
Um dos que tenho aqui é de um disco que comprei na feira da Praça XV, é o Help!, onde dentro tinha um bilhete que dizia: Parabéns Arnaldo, me salve pois o mundo é louco, e feliz aniversário. Ass. Mercedes.

Foto: O rack da sala, expondo 1/4 dos meus discos, alguns DVDs e dois livros.

sexta-feira, 5 de abril de 2013

Vanessa

Ontem resolvi ir à casa da Vanessa, e nem pensei muito, há tempos que não aporto por lá. Ela nunca atende a porta na primeira batida, mas dessa vez demorou mais que o normal e resolvi mandar um SMS, de repente nem tá em casa, vai saber. Ela responde: tô no banho, a chave no lugar de sempre. Entra e abre uma garrafa de vinho que não demoro.
Há tantas coisas boas para a gente abrir na vida, uma carta, uma porta enquanto esperamos o outro bater e por aí vai..., mas duas estão no topo do desejo, e que sei bem abrir, e gosto, garrafa e um belo par de pernas morenaças.
Entro e lá vem o bichano, o nome dele é Toma. Já vem o Toma todo curioso, caçando o que tenho nos bolsos, mas vai embora, pois nos bolsos nada, mas nas mãos só desejos pela Vanessa. Vou pra cozinha pegar o vinho e copos.
A cozinha da Vanessa é foda, bagunçada pra caralho. Uma mesa com duas cadeiras, meia cebola na geladeira e uma garrafa d'água, mas sempre tem uma bebida lá por dentro. Pego a garrafa do velho tinto barato, abro com uma facilidade, como criança que abre um bombom, encho meu copo e vou pra sala.
Acendi um cigarro, liguei o som e play, Leonard Cohen cantando "brid on the wire". Lembrei de uma foto que fiz certa vez que estava em Brasília. Uns pássaros pousados num fio cantavam pra mim, e se pusesse uma clave de sol, era algo triste, como o Cohen e sua voz meio fúnebre.
Ela abre a porta do banheiro, e junto com os passos, lá vem aquele cheiro delicioso de sabonete misturado com shampoo e a voz deliciosamente meio rouca: seu filho da puta, canalha!
Entre garrafas de vinho e outras coisas, trepamos. Ela dormiu nua, linda, e eu aqui na janela fumando um cigarro, ouço o rádio do vigia, que na calçada do vizinho, dorme como um bêbado.

quinta-feira, 4 de abril de 2013

Sem cores nem sons



Há em mim uma dificuldade em ver cores. Daltonismo que sei lá? Mas ouço bem. Hã? Lembra daquele dia na praça? Aquela outra pracinha... E eu ouvia os pássaros voando e você não? Aquilo era música, um lindo choro de passarinho. Das tantas cores que você sente, para mim são cinzas. Mas a gente vai seguindo, eu a te preencher, e para minha sorte, a gente trepando, dois seres a merecer.